Pela segunda vez em menos de duas semanas, o Itamaraty reagiu enfaticamente às críticas feitas por especialistas da ONU e da OEA (Organização dos Estados Americanos) sobre a situação de direitos humanos no país. Em nota à imprensa divulgada no início da noite de ontem (8), o Ministério das Relações Exteriores qualificou como “infundada” a afirmação de quatro relatores especiais de que “os direitos dos povos indígenas e o direito ambiental estão sob ataque no Brasil”.
A crítica do Itamaraty voltou-se contra comunicado conjunto publicado na manhã de ontem pelos relatores sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, sobre defensores de direitos humanos, Michel Forst, e sobre meio ambiente e direitos humanos, John Knox, além do relator da CIDH para os direitos dos povos indígenas, Francisco José Eguiguren Praeli.
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Na nota à imprensa, o Itamaraty afirmou que os direitos dos povos indígenas estão assegurados na Constituição Federal e nos tratados internacionais ratificados pelo Brasil e que muitas das medidas criticadas pelos especialistas ainda estão em discussão no Congresso Nacional.
Os argumentos da chancelaria foram rebatidos por 44 organizações da sociedade civil, para as quais a avaliação do governo é "equivocada e descolada da realidade". Em nota de repúdio publicada na tarde desta sexta-feira (9), as entidades afirmam que que "os conflitos causados por disputas territoriais e a má gestão de áreas protegidas estão plenamente instalados" no país e se traduzem no agravamento da violência contra trabalhadores rurais e comunidades indígenas.
“O Brasil não tem conseguido ser coerente com seus próprios compromissos e agrava tal posicionamento com ataques aos órgãos de direitos humanos da ONU e da OEA”, dizem na nota.
Como exemplo dos retrocessos nesse âmbito, as organizações mencionam a nomeação de Osmar Serraglio (PMDB-PR) para o Ministério da Justiça, retirado do cargo no final de maio. Serraglio foi relator na Câmara dos Deputados da proposta de emenda constitucional que transfere a responsabilidade pela demarcação de terras para o Congresso (PEC 215).
Também citam os debates ao redor da proposta de Lei Geral de Licenciamento Ambiental (PL 3729/04), que tramita em urgência na Câmara e isenta atividades potencialmente poluidoras do processo de licenciamento, além de tornar não obrigatória a manifestação de órgãos como a Funai durante a aprovação de projetos.
"Ao contrário da aparente neutralidade que se pretende transmitir frente a todas essas disputas e conflitos, é extensa a lista de fatos que reforçam a percepção de que o governo escolheu estar do lado de espoliadores dos direitos de povos indígenas e dos grupos de interesse que pretendem enfraquecer o nosso arcabouço de proteção ambiental", afirmam.
Clique aqui para ler a nota de repúdio publicada por organizações da sociedade civil.
Críticas à posição do governo também foram feitas pela Conectas Direitos Humanos diante do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, na manhã desta sexta-feira (9). Em pronunciamento, a organização expôs o pacote de medidas em debate no Congresso, com o apoio do Planalto, que podem fazer o Brasil "retroceder anos, senão décadas" em matéria de proteção ambiental.
A entidade mencionou a aprovação, no final de maio, de duas medidas provisórias que diminuem áreas de proteção ambiental no Pará e em Santa Catarina correspondentes a duas vezes o tamanho de Hong Kong. "Caso sancionadas pelo presidente, [estas medidas] vão abrir caminho para mais desmatamento e conflitos de terra", além de "ameaçar os objetivos assumidos pelo Brasil no Acordo de Paris", afirmou a organização diante do plenário do Conselho.
No início da tarde de hoje, após o pronunciamento da Conectas, o governo brasileiro solicitou seu direito de resposta e usou seu tempo de fala tarde para ler a nota divulgada ontem pelo Itamaraty.